Em artigo anterior, comentei que o consumidor precisa de informações sobre os impactos ambientais e sociais de seu consumo para que possa exercer escolhas conscientes de consumo. Há outro ponto igualmente importante ao qual as empresas deveriam dar mais atenção: a comunicação do risco envolvido na compra, uso ou descarte de seus produtos.
Se consumidos de forma incorreta ou exagerada, muitos produtos podem, por exemplo, provocar danos à saúde. Alguns são bem conhecidos e debatidos na mídia, como é o caso do açúcar ou de alimentos com alto teor de gordura. Menos comentado é o caso dos veículos motorizados, visto que causam impactos na saúde das pessoas de forma indireta, por via da poluição. A poluição prejudica principalmente crianças e idosos e agrava doenças cardiovasculares e respiratórias. Além disso, a queima dos combustíveis usados pelos veículos é uma das principais fontes de emissão de dióxido de carbono, o principal gás de efeito estufa, cujo aumento na atmosfera tem levado ao aquecimento global e às mudanças climáticas.
Tais impactos sobre a saúde e o meio ambiente raramente são considerados por alguém que pensa em comprar um automóvel ou em dirigi-lo pelas ruas. E muito pouca informação é oferecida pelas fábricas e concessionárias de vendas de veículos a respeito desses impactos, como mostra uma pesquisa recente do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). De acordo com a pesquisa, nenhuma das onze fábricas instaladas no Brasil informa sobre a emissão de poluentes, a emissão de gases de efeito estufa e a eficiência energética dos automóveis que vendem.
Além de ser uma obrigação ética, comunicar os riscos e os possíveis danos provocados pelos produtos será, a meu ver, uma questão de sobrevivência para as empresas do século XXI. Ao informar de forma transparente sobre os riscos no consumo de seus produtos, as empresas estarão se diferenciando frente aos concorrentes e estarão reduzindo os riscos futuros de condenações relativas ao impacto individual e coletivo do uso de seus produtos.
Em tempos de transparência e visibilidade, já não cabem comportamentos como foi o da indústria do tabaco durante o século passado, quando os executivos dessas empresas negavam publicamente as informações de danos à saúde associados ao uso de seu produto, além de promoverem o marketing e a publicidade ligando o cigarro a esportes, música, vida saudável e modernidade.
O começo do fim dessa prática foi firmado em 1998 entre sete indústrias de tabaco e o governo americano, prevendo o pagamento de indenizações estimadas em U$ 206 bilhões e o fim das práticas de marketing e publicidade, com a obrigatoriedade de divulgação das informações sobre os males do fumo. Tamanho prejuízo financeiro, entretanto, é pequeno se comparado ao tamanho do fardo moral que essa indústria carrega, mesmo que tenha mudado sua postura e buscado de maneira mais ativa alertar para os perigos do consumo de seu produto.
No caso do cigarro, dada a dependência química que causa, o risco do consumo é inerente ao produto. Já em diversos outros produtos – alimentos, bebidas, automóveis, eletroeletrônicos etc – o risco não está embutido no produto, mas ocorrerá caso o consumidor não use as informações disponíveis para garantir o menor impacto negativo possível, sobre si próprio e sobre a coletividade, quando da escolha do produto, no seu uso e na sua forma de descartá-lo.
Deixar de comunicar sobre os riscos de um produto poderá ter custos cada vez maior para as empresas, seja um custo reputacional, seja um custo financeiro por problemas de responsabilização judicial.
É possível que, a partir da disponibilidade de informações, os consumidores rejeitem ou mudem a forma de consumir alguns produtos. Em vez de olhar esse fato como uma ameaça, as empresas deveriam percebê-lo como uma sinalização da direção a seguir: por exemplo, desenvolver produtos menos danosos à saúde das pessoas e ao ambiente, como sucos de fruta com menos açúcar, ou carros que gastam menos combustível e emitem menos poluentes, ou então, dar publicidade aos produtos de maneira a não levar ao seu consumo exagerado.
A transparência é um fato, não uma escolha. Nesse sentido, dar transparência é antecipar algo que ocorrerá irremediavelmente. Melhor fazer da transparência um aliado, do que esperar inutilmente que os efeitos negativos da compra, uso ou descarte de produtos ou serviços não ocorram por obra de um consumidor que desenvolve sua própria consciência de maneira desinformada. Tomar a dianteira, revelando o que será revelado de qualquer forma, possibilita ganhar em reputação muito mais do que eventualmente poderá ser perdido por não ter informado a tempo sobre os riscos no consumo. Sem informação, muitos produtos são de risco, e, com ela, o risco não é intrínseco ao produto, mas ao seu consumo, pois o consumidor estará informado sobre como deveria agir, na compra, uso e descarte do produto, para seu próprio bem e de sua coletividade. Hélio Mattar
* Helio Mattar é diretor-presidente do Instituto Akatu. Artigo publicado originalmente no jornal Meio & Mensagem.
Fonte: Mercado Ético
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